Campanhas

Memória: Renato Russo o Filho da Revolução

No cenário musical brasileiro dos anos 80, Renato Russo se destacou como um talentoso cantor e compositor, deixando sua marca como fundador e vocalista da icônica banda de Pop Rock, “Legião Urbana”.

Nascido Renato Manfredini Júnior em 27 de março de 1960, no Rio de Janeiro, Russo tinha uma ligação profunda com a música desde sua infância. Filho de Renato Manfredini, funcionário do Banco do Brasil, e Carminha Manfredini, cresceram na Ilha do Governador. Sua vida deu uma guinada em 1967, quando a família se mudou para Nova York devido à transferência de seu pai. Dois anos depois, já estava de volta ao Brasil, mas a estadia nos Estados Unidos deixou marcas profundas em Russo, moldando sua futura carreira musical.

A mudança definitiva para Brasília em 1973 marcou outra fase crucial na vida de Renato. Aos 15 anos, descobriu o diagnóstico de uma doença óssea, que o levou a passar por uma cirurgia de implante de pinos na bacia. Durante os seis meses de recuperação, Russo, sempre apaixonado pela música, mergulhou ainda mais no universo sonoro, consolidando sua paixão pela arte.

Mesmo enfrentando desafios de saúde, Renato não deixou que isso o impedisse de seguir seus sonhos. Ingressou no curso de jornalismo no Centro de Ensino Universitário de Brasília enquanto ainda se recuperava. Com sua fluência em inglês, também iniciou uma lecionar na Cultura Inglesa, demonstrando suas emoções e paixão pelo conhecimento.

Aos 18 anos, Renato Russo revelou para identidade de sua mãe um aspecto íntimo de sua, tornando pública sua bissexualidade. Essa transparência sobre sua vida pessoal destacou a coragem de Russo, que não apenas quebrou barreiras na música, mas também contribuiu para abrir caminhos importantes na sociedade.

O legado de Renato Russo transcende as notas musicais; é uma história de resiliência, influência e contribuição marcante para a cena cultural brasileira.

Legião Urbana

No ano de 1978, Renato Russo cruzou o caminho de Fê Lemos, dando início a uma colaboração que se iniciou com a paixão compartilhada pelo punk rock americano. Juntamente com André, filho do embaixador da África do Sul, eles formaram uma banda que, após algumas alterações na formação, começou a se apresentar profissionalmente. No entanto, o sucesso inicial foi interrompido por uma briga entre Renato e Fê, resultando na separação da banda.

Da dissolução desse primeiro grupo surgiria uma fase nova e marcante na carreira de Renato Russo. Ao unir forças com Marcelo Bonfá, Eduardo Paraná e Paulo Guimarães, ele fundou a icônica “Legião Urbana”. Russo, influenciado por figuras como Morrissey, do The Smiths, e Robert Smith, do The Cure, já trazia consigo uma bagagem musical rica. Em 1983, Dado Villa-Lobos assumiu a guitarra, consolidando a formação da banda.

A “Legião Urbana” desempenhou um papel fundamental na efervescência do rock brasileiro nos anos 80, com suas músicas frequentemente liderando as paradas. Destacam-se nesse período álbuns cruciais como “Legião Urbana 2” (1986) e “Quatro Estações” (1989).

A formação da banda nessa época incluía Dado Villa-Lobos na guitarra, Marcelo Bonfá na bateria, Renato Russo no violão acústico e Renato Rocha no baixo elétrico.

Renato Russo, à frente da Legião Urbana, produziu sucessos memoráveis, como “Será” (1985), “Eduardo e Mônica” (1986), “Que País é Esse” (1987) e “Pais e Filhos” (1989). Ao longo desse período, a Legião Urbana lançou sete álbuns, solidificando-se como uma das bandas mais influentes da cena musical brasileira até 1996.

Renato Russo iniciou sua carreira solo em 1993, ainda fazendo parte da Legião Urbana. No ano seguinte lançou The Stonewall Celebration Concert (1994), cujo título é uma referência a um bar de Nova Iorque onde, em 1969, gays se rebelaram contra a ação da polícia.

Em seguida, lançou o CD Equilíbrio Distante (1995), interpretando canções italianas. Depois de sua morte, foi lançado O Último Solo (1997).

Doença e Morte

Em uma triste noite de 11 de outubro de 1996, às 01h15 da madrugada, o talentoso músico Renato Russo nos deixou, vítima de complicações decorrentes da doença pulmonar obstrutiva crônica, septicemia e infecção urinária, todas relacionadas à AIDS. Vale destacar que Renato era soropositivo desde 1989, embora tenha optado por não divulgar publicamente sua condição.

O artista, conhecido por sua presença icônica nos palcos e por ser vocalista da renomada banda Legião Urbana, deixou um legado duradouro. Na época de sua partida, seu filho, o jovem produtor cultural Giuliano Manfredini, contou com apenas 7 anos de idade.

Em um ato simbólico, o corpo de Renato Russo foi cremado, e suas cinzas foram lançadas no Sítio Roberto Burle Marx. Curiosamente, no momento do lançamento das cinzas, o ex-baixista da Legião Urbana, Renato Rocha, estava passando com sua namorada, e um incidente marcante ocorreu: o pneu de sua moto furou exatamente em frente ao local da cerimônia.

Onze dias após a trágica perda de Russo, em 22 de outubro de 1996, Dado Villa Lobos e Marcelo Bonfá, juntamente com o empresário Rafael Borges, anunciaram o fim das atividades da Legião Urbana. Estima-se que, ao longo da vida de Renato, a banda tenha alcançado uma marca expressiva de cerca de 20 milhões de discos vendidos no Brasil.

Filmografia e livros

No ano de 1999, o produtor Luiz Fernando Borges apresentou à família Manfredini um projeto de documentário, solicitando não apenas a autorização, mas também a participação de todos, sendo aceito por cada membro. Contudo, em 2005, surgiu a notícia de que o documento mencionado havia sido descartado, dando lugar à produção de um filme intitulado “Religião Urbana”. Posteriormente, a família sugeriu que Renato Russo não aprovaria o título “Religião”, acarretando uma alteração para o nome “Somos tão jovens”. Dirigido por Antônio Carlos da Fontoura, com roteiro de Marcos Bernstein e trilha sonora original de Carlos Trilha, o filme aborda a juventude de Renato Russo, interpretado por Thiago Mendonça, explorando o início de seu envolvimento com a música, a criação e dissolução do Aborto Elétrico, além da fase d’O Trovador Solitário e dos dois primeiros anos da Legião Urbana Distribuído pela Imagem Filmes e Fox Film Brasil, o longa estreou nos cinemas em 3 de maio de 2013.

Logo em seguida, em 30 de maio, foi lançada “Faroeste Caboclo”, uma adaptação da famosa canção de Renato, dirigida por René Sampaio, com roteiro de Victor Atherino e Marcos Bernstein baseado na letra original, e distribuição da Europa Filmes. O elenco conta com Fabrício Boliveira (João de Santo-Cristo), Ísis Valverde (Maria Lúcia), Felipe Abib (Jeremias) e César Troncoso (Pablo).

Em julho de 2018, tiveram início a gravação da adaptação cinematográfica de “Eduardo e Mônica”, com a revelação dos atores Gabriel Leone no papel de Eduardo e Alice Braga interpretando Mônica.

Ao longo de sua carreira, Renato Russo deixou um legado literário que transcendeu sua presença física. Com quatro obras publicadas em vida, o músico ganhou uma segunda vida literária após sua morte, com mais quatro livros lançados em seu tributo póstumo. Entre essas obras, destaca-se “Conversas com Renato Russo”, uma compilação de entrevistas que revela o ponto de vista do artista sobre temas como rock, bissexualidade (incluindo a sua própria), mundo, drogas e política.

Do ponto de vista analítico, a crítica literária acadêmica também se dedicou ao estudo da obra de Russo. “Depois do Fim — vida, amor e morte nas canções da Legião Urbana”, de Angélica Castilho e Erica Schlude, ambas da UERJ, é uma contribuição significativa que mergulha na análise técnica das letras e músicas da Legião Urbana. Além disso, os trabalhos de Arthur Dapieve, como “O Trovador Solitário” e “BRock — O rock brasileiro nos anos oitenta”, oferecem insights valiosos para compreender o contexto e a influência do artista na cena musical.

A biografia “Renato Russo: O filho da Revolução”, lançada em junho de 2009 por Carlos Marcelo Carvalho, oferece uma visão abrangente da vida do músico. Desde sua infância até o amadurecimento como homem, poeta, artista e músico, a obra contextualiza os acontecimentos históricos, incluindo o período opressivo da Ditadura Militar, que moldaram a jornada de Russo.

Em 2015, a Companhia das Letras lançou “Só Por Hoje e Para Sempre – Diário do Recomeço”, um livro que mergulhou nos 29 dias em que Renato Russo esteve internado em uma clínica de reabilitação para dependentes químicos no Rio de Janeiro. O diário, parte integrante do programa dos Doze Passos dos Alcoólicos Anônimos, oferece uma visão íntima do processo de recuperação do músico.

Em 2016, um romance intitulado “The 42nd St. Band – Romance de uma banda imaginária” foi lançado postumamente. Escrito em inglês, o livro narra a trajetória de uma banda fictícia em Londres setentista, apresentando algumas semelhanças intrigantes com a própria jornada da Legião Urbana.

No ano de 2017, surgiu o “Livro das Listas”, uma compilação que revelou as seleções pessoais de Renato Russo, abrangendo músicas, discotecas, atores, e outros tópicos. Este material oferece aos fãs uma visão mais profunda das preferências e influências que moldaram o gosto do músico icônico brasileiro.

Homenagens

Em 2004, Renato Russo foi postumamente agraciado com a Ordem do Mérito Cultural durante uma conferência realizada no Palácio do Planalto. A entrega da insígnia foi conduzida pelo presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e pelo Ministro da Cultura Gilberto Gil.

Em 2006, diversos artistas de diferentes estilos prestaram homenagem ao ícone por meio do CD intitulado “Renato Russo – Uma Celebração”. Em 2013, trechos de suas composições mais famosas foram utilizados durante os protestos que mobilizaram o país entre junho e julho, evidenciando que os conceitos que ele ajudou a criar tornaram-se referências e começaram a influenciar as novas gerações.

No ano de 2016, seu filho Giuliano Manfredini especificou um novo tributo denominado “Viva Renato Russo”. O álbum apresenta versões das músicas da Legião Urbana interpretadas por novas bandas do rock nacional, como Vespas Mandarinas, Selvagens à Procura de Lei, Far From Alaska, entre outras.

Renato Russo recebeu homenagens pelo conjunto de sua obra e pela influência no cinema brasileiro durante a oitava edição do “LABRFF – Los Angeles Brazilian Film Festival”, um importante festival do cinema brasileiro realizado fora do país.

Em 20 de julho de 2012, uma estátua em homenagem a Renato Russo foi inaugurada na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro, local de nascimento do músico, na Estrada do Galeão, número 2.275. A cerimônia contou com a presença de amigos e familiares do artista. Uma estátua de bronze, pesando 250 quilos e com 1,75 metros de altura, está instalada sobre um palco de granito de dois metros de diâmetro, sendo assinada pelo artista Ique, encomendada pela prefeitura.

Em 18 de fevereiro de 2017, Renato Russo foi homenageado no Museu da Imagem e do Som, onde mais de mil itens de sua coleção particular foram expostos.

| Editoria Virtuo Comunicação

| Projeto Comunicando ComCausa

| Portal C3 | Instagram C3 Oficial

João Oscar

João Oscar é jornalista militante de direitos humanos da Baixada e colaborador da ComCausa