Dom José Maria Pires, carinhosamente apelidado de Dom Zumbi pelo movimento negro, é uma figura emblemática da luta contra o racismo e da defesa dos direitos humanos no Brasil. Primeiro bispo negro do país, sua trajetória uniu fé, militância e um profundo compromisso com a justiça social.
Nascido em 15 de março de 1919, na pequena cidade de Córregos, em Minas Gerais, José Maria Pires desafiou os padrões de uma igreja marcada por estruturas excludentes. Ordenado bispo de Araçuaí (MG) em 1957, tornou-se o único bispo negro do Brasil na época. Mais tarde, como arcebispo da Paraíba, cargo que ocupou de 1966 a 1995, ele consolidou seu papel de liderança, atuando ao lado dos marginalizados e sendo uma voz profética em tempos de repressão e desigualdade.
O pastor do Povo e a Teologia Afro-Brasileira
Dom Zumbi não apenas pregava a fé; ele vivia a missão de transformar a realidade ao seu redor. Em suas homilias e ações, enfatizava a organização do movimento negro e a luta contra o racismo. Durante uma romaria ao Quilombo dos Palmares, em Alagoas, em comemoração ao centenário da abolição da escravatura, recebeu o título simbólico de Dom Zumbi. Em 1991, na histórica Missa dos Quilombos, no Recife, proferiu uma homilia que se tornou referência da Teologia Afro-Brasileira Contemporânea, inspirando a criação da Pastoral Afro-Brasileira (PAB).
“Enquanto imperar a fome, a miséria e o analfabetismo, enquanto não se respeitar no operário e no camponês a dignidade da pessoa humana, os cristãos não estarão sendo cristãos”, dizia ele, desafiando estruturas sociais e eclesiásticas.
Compromisso com os direitos humanos e a libertação
Durante o regime militar, Dom José se destacou como defensor intransigente dos direitos humanos. Visitava presos políticos, criticava o autoritarismo e liderou iniciativas como o Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Arquidiocese da Paraíba, que atuou diretamente no enfrentamento à ditadura. Foi um dos precursores da Teologia da Libertação, incentivando movimentos populares e as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs).
Defensor das comunidades quilombolas, indígenas, mulheres em situação de vulnerabilidade e trabalhadores rurais, articulou ações junto à Comissão Pastoral da Terra (CPT) e enfrentou o racismo estrutural dentro e fora da Igreja.
O reconhecimento do movimento negro e a luta permanente
Dom Zumbi foi uma figura central na articulação dos bispos negros, sendo peça-chave na construção de uma Igreja mais inclusiva e representativa. Para o padre Luís Miguel Modino, que escreveu sobre seu centenário em 2019, sua vida foi um exemplo de cristianismo vivo, como destacou dom Hélder Câmara:
“Dom José Maria vai às causas, vai às raízes… E fala claro, sem perder a serenidade, mas chamando as coisas pelos nomes”.
Até o final de sua vida, Dom José Maria Pires manteve-se comprometido com a fé encarnada no mundo, defendendo os pobres e oprimidos. Faleceu em 27 de agosto de 2017, aos 98 anos, como o bispo mais idoso do Brasil. Sua data de falecimento coincide com a de outro gigante da Igreja, dom Hélder Câmara, fortalecendo o simbolismo de sua trajetória.
Legado e inspiração: O Bispo Negro da resistência e da esperança
O legado de Dom Zumbi transcende o tempo. Sua luta pela dignidade humana e pela inclusão permanece viva, ecoando nos movimentos negros, na Pastoral Afro-Brasileira e em todas as ações que buscam justiça social. Sua frase de 1976 ressoa como alerta e esperança:
“Quando se cansar a paciência do pobre que está sendo esmagado pelos poderosos, a de Deus também se cansará, e Deus virá fazer a justiça que os homens se recusaram a fazer”.
Hoje, sua memória é celebrada como inspiração para quem acredita na construção de um mundo mais justo e igualitário. Dom José Maria Pires, ou Dom Zumbi, é um farol de resistência, fé e esperança para o Brasil e além.
Campanha Nossa Gente Negra 2024 Dom José Maria Pires
Em 2024, a campanha “Nossa Gente Negra”, promovida pela ComCausa, que têm como objetivo valorizar personalidades negras que se destacaram na luta por igualdade e justiça no Brasil, homenagiou Dom José Maria Pires, conhecido como Dom Zumbi, em reconhecimento à sua incansável atuação em defesa dos direitos humanos e da inclusão social. A campanha aconteceu nos dias 18, 19 e 20 de novembro, com publicações nas redes sociais e matérias especiais no Portal C3. No Dia da Consciência Negra, a ComCausa também lançará uma página memorial dedicada a Dom Zumbi em seu site oficial da ComCausa lançará uma página memorial em seu site, dedicada a Dom Zumbi (comcausa.org.br/domzumbi).
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