Mortes de jovens negros por violência policial serão denunciadas no Fórum da ONU em Nova York

Criança, mulher negra, violência

Entre os dias 14 e 17 de abril de 2025, acontece na sede das Nações Unidas, em Nova York, a 4ª edição do Fórum Permanente de Afrodescendentes. Com o tema “África e Pessoas Afrodescendentes: Unidos pela Justiça Reparatória na Era da Inteligência Artificial”, o evento reúne especialistas, autoridades, representantes da sociedade civil e lideranças internacionais para debater os desafios enfrentados por populações negras em todo o mundo. Um dos destaques da participação brasileira será a denúncia dos altos índices de assassinatos de jovens negros, especialmente em ações envolvendo agentes de segurança pública.

A delegação brasileira no Fórum trará à pauta as bases que fundamentaram a proposta do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 18 (ODS 18), voltado à Igualdade Étnico-Racial, defendido pelo Brasil na 78ª Assembleia Geral da ONU em 2023. A coordenadora do Observatório ODS 18, Maria do Carmo Rebouças, professora da Universidade Federal do Sul da Bahia e especialista em Direito Internacional, é uma das representantes do país na iniciativa. Ela participará de painéis voltados à justiça restaurativa para a África e sua diáspora, com ênfase na reparação histórica e institucional exigida pelas populações negras no Brasil.

Em sua intervenção, Maria do Carmo Rebouças deve abordar os impactos da violência policial sobre a juventude negra no Brasil, denunciando o que considera uma política sistemática de extermínio. Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mais de 30 mil jovens negros são assassinados todos os anos no país — o que equivale a uma morte a cada 23 minutos. A especialista ressalta que essas estatísticas não podem ser compreendidas fora do contexto do racismo estrutural, da militarização das polícias e da impunidade recorrente nos crimes cometidos por agentes do Estado.

A expectativa da delegação brasileira é apresentar um conjunto de recomendações ao sistema internacional de direitos humanos, com destaque para a necessidade de desmilitarização das forças de segurança, responsabilização efetiva dos agentes envolvidos em mortes de civis, e ações concretas de justiça reparatória. Para Rebouças, reparação não se resume a compensações financeiras, mas exige uma transformação estrutural e cultural que combata os efeitos do colonialismo, do escravismo e das desigualdades raciais que ainda moldam a sociedade brasileira. O Brasil, com sua história marcada por profundas injustiças raciais, leva ao Fórum a urgência de um debate global sobre o direito à vida da juventude negra.

Violência letal atinge em cheio a juventude negra: mais de 15 mil mortos em três anos no Brasil

Dados recentes divulgados por órgãos oficiais brasileiros revelam uma realidade alarmante e persistente: a violência letal continua atingindo de forma desproporcional a juventude negra no país. Entre 2021 e 2023, mais de 15 mil crianças e adolescentes com até 19 anos foram mortos por causas violentas no Brasil. A esmagadora maioria dessas vítimas – 91,6% – tinha entre 15 e 19 anos. O recorte racial revela que 82,9% dos mortos eram negros (pretos ou pardos), sendo 90% do sexo masculino.

Os números revelam não apenas a tragédia humana, mas também a urgência de políticas públicas voltadas à prevenção da violência e à equidade racial. De acordo com os dados, a taxa de homicídios entre adolescentes negros de até 19 anos é de 18,2 por 100 mil habitantes, enquanto a de brancos na mesma faixa etária é de 4,1. Isso significa que adolescentes negros têm 4,4 vezes mais chances de serem assassinados do que os brancos, o que escancara o impacto do racismo estrutural e institucional na segurança pública brasileira.

O Atlas da Violência 2024, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, também reforça esse cenário. Segundo o levantamento, em 2022, 76,5% das 46.409 vítimas de homicídio no Brasil eram negras. A taxa de assassinatos entre negros foi de 29,7 por 100 mil habitantes, quase três vezes superior à taxa entre não negros, que ficou em 10,8. Os dados apontam que a cor da pele ainda é um dos principais fatores de vulnerabilidade à violência letal no país.

Diante desses indicadores, especialistas, movimentos sociais e organizações de direitos humanos têm cobrado ações estruturais e reparatórias. Entre as propostas estão a reformulação dos modelos de policiamento, o enfrentamento à militarização da segurança pública, o investimento em políticas de juventude e educação nas periferias, além da responsabilização efetiva dos agentes estatais envolvidos em mortes de civis. A crise da segurança no Brasil, sobretudo para a população negra e jovem, exige respostas urgentes que passem pela justiça racial e pelo combate ao genocídio silencioso que atravessa gerações.

Estudo revela que 86% dos mortos pela polícia no Rio de Janeiro são negros

Um levantamento realizado pela Rede de Observatórios da Segurança expôs dados alarmantes sobre a violência policial no Brasil, especialmente no Estado do Rio de Janeiro. Segundo o estudo, o Rio liderou o ranking nacional de mortes provocadas por ações e intervenções policiais em 2020, com um total de 1.245 vítimas fatais. Dentre os mortos pela polícia fluminense, 86% eram pessoas negras — sendo 54,8% pardos e 31,2% pretos.

A capital fluminense concentrou a maior parte dessas mortes, com 415 registros — 90% dos quais também de pessoas negras. A desigualdade racial é ainda mais evidente quando comparada à composição da população: a proporção de negros mortos pela polícia supera em muito a sua representação demográfica, revelando a seletividade da letalidade policial. A cena recorrente de operações policiais em comunidades periféricas, com tanques blindados e tiroteios em áreas residenciais, contribui para um cenário de medo e insegurança para a população negra e pobre.

São Paulo aparece logo atrás no ranking, com 814 mortes causadas por agentes do Estado. Em 63% dos casos, as vítimas também eram negras, embora esse grupo corresponda a apenas 35% da população paulista. Na capital paulista, o índice é ainda mais expressivo: 69% das vítimas de ações policiais eram pretas ou pardas. A pesquisa também analisou outros Estados, como Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco e Piauí, revelando um padrão preocupante de violência letal seletiva em todo o país.

Em cidades como Salvador, Fortaleza e Recife, 100% dos mortos em operações policiais eram negros. Na Bahia, 98% das vítimas da polícia pertencem à população negra. No Ceará, uma pessoa negra tem sete vezes mais chances de morrer em uma ação policial do que uma pessoa branca. Esses dados escancaram a relação direta entre racismo estrutural e violência de Estado no Brasil, exigindo medidas urgentes de reforma policial, políticas de reparação histórica e proteção dos direitos humanos nas periferias urbanas.

Brasil registrou ao menos 16 massacres em operações policiais nos últimos 20 anos

Um levantamento recente revelou que o Brasil acumulou ao menos 16 massacres resultantes de operações policiais ao longo das últimas duas décadas. As ações, marcadas pelo uso excessivo da força em áreas de alta vulnerabilidade social, têm gerado uma escalada de mortes com forte recorte racial e geográfico, especialmente nas periferias urbanas. O estado do Rio de Janeiro aparece como epicentro dessa política letal, sendo palco de algumas das mais violentas intervenções da história recente do país.

Entre os episódios mais emblemáticos está a chacina do Jacarezinho, ocorrida em maio de 2021, que resultou em 29 mortos e se tornou a operação policial mais letal da história do Rio. A ação foi alvo de diversas denúncias nacionais e internacionais, incluindo manifestações da Organização das Nações Unidas e de entidades de direitos humanos. A operação ocorreu em meio a decisões do Supremo Tribunal Federal que restringiam esse tipo de intervenção durante a pandemia, o que intensificou as críticas quanto à legalidade e proporcionalidade da ação.

Outro caso de grande repercussão foi a operação na Vila Cruzeiro, em maio de 2022, que terminou com 25 mortos e é considerada a segunda mais letal do estado. Já em julho do mesmo ano, a operação no Complexo do Alemão, que durou mais de 12 horas, deixou 17 mortos — entre eles, um policial e uma moradora atingida por bala perdida. De acordo com o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF), essa foi a quinta maior chacina policial registrada no Rio de Janeiro.

Esses eventos ilustram um padrão de atuação das forças de segurança brasileiras, frequentemente denunciado por organizações da sociedade civil como racista, seletivo e marcado pela impunidade. Para entidades de direitos humanos, os massacres revelam não apenas falhas operacionais, mas uma política de segurança pública baseada no confronto armado e na lógica do inimigo interno, que recai majoritariamente sobre jovens negros e moradores de favelas. O cenário exige uma urgente revisão das estratégias de policiamento, com foco na preservação da vida, no respeito aos direitos fundamentais e no fortalecimento de mecanismos de controle externo das atividades policiais.

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