A Justiça Federal absolveu a Samarco e suas controladoras Vale, BHP Billiton e a empresa de consultoria VogBR pela tragédia do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, Minas Gerais, que ocorreu em 2015. A decisão do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), publicada na madrugada desta quinta-feira (14), considerou insuficientes as provas para responsabilizar criminalmente as empresas e sete indivíduos, entre diretores, gerentes e técnicos, incluindo Ricardo Vescovi, então presidente da Samarco.
O rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 5 de novembro de 2015, devastou os distritos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, liberando cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração que poluíram o Rio Doce e seus afluentes, alcançando o Oceano Atlântico. A enxurrada de lama resultou na morte de 19 pessoas e causou prejuízos ambientais e sociais profundos e irreparáveis. Mesmo com as evidências dos danos catastróficos, a Justiça não encontrou provas suficientes para atribuir uma responsabilidade criminal individual às empresas e aos réus.
Histórico do Processo e Mudanças na Denúncia
Em 2016, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou 22 pessoas e quatro empresas, entre elas Samarco, Vale, BHP e VogBR, pelos crimes de homicídio qualificado, desabamento, lesões corporais graves, inundação e crimes ambientais. No entanto, em 2019, a Justiça retirou a acusação de homicídio, entendendo que as mortes foram uma consequência da inundação causada pelo rompimento, e muitos dos crimes ambientais prescreveram ao longo dos anos.
O MPF já anunciou que pretende recorrer da decisão. Em sua defesa, a Justiça Federal declarou que, apesar das provas de destruição e perdas humanas, não foi possível identificar responsabilidades específicas e ações diretas que justificassem condenações criminais.
Responsabilidade e Previsão de Riscos: Julgamento na Inglaterra
Informações trazidas recentemente em um julgamento paralelo no Reino Unido mostram que a BHP, uma das controladoras da Samarco, tinha ciência dos riscos envolvidos. Documentos revelaram que, cinco anos antes da tragédia, a BHP estimava que um eventual colapso da barragem poderia resultar em 100 mortes e em gastos de cerca de US$ 1,25 bilhão em indenizações e multas.
Essas revelações, apresentadas pelo escritório de advocacia Pogust Goodhead, representante das vítimas, expuseram que a empresa tinha conhecimento das vulnerabilidades da barragem e sabia que Bento Rodrigues seria a área mais afetada em caso de rompimento. Contudo, nenhuma medida preventiva de evacuação foi implementada.
Impacto para as Vítimas e as Comunidades Atingidas
Nove anos após o desastre, as comunidades atingidas ainda enfrentam as consequências da destruição. Muitos moradores continuam sem moradia permanente, o Rio Doce e seus ecossistemas seguem comprometidos, e comunidades, incluindo a indígena Krekak, lutam para reconstruir suas vidas e modos de subsistência. Organizações e comunidades impactadas manifestaram frustração e indignação com a decisão da Justiça, vendo-a como um símbolo da impunidade que muitas vezes afeta casos de grandes desastres corporativos no Brasil.
Repercussões e o Caminho para Justiça
A decisão do TRF-6 gera um sentimento de descrença e inconformismo entre os afetados e ativistas ambientais. A tragédia de Mariana continua a ser um dos maiores desastres ambientais do Brasil, marcando profundamente a história do país e evidenciando a necessidade de revisões nas políticas de fiscalização e de gestão de risco para operações de mineração.
Como destaca a ComCausa, organização que atua com o projeto ComuniSaúde na promoção da saúde e do bem-estar em áreas vulneráveis, a decisão de absolvição deixa uma lacuna preocupante na responsabilidade corporativa. Para João Oscar membro da organização, “o caso de Mariana não é apenas uma questão ambiental, mas uma crise de saúde pública e de direitos humanos que afeta a saúde física, mental e socioeconômica das pessoas diretamente atingidas”.
Nota de Repúdio da ComCausa à Absolvição da Samarco e Outras Empresas Pelo Desastre de Mariana
A ComCausa, organização dedicada à defesa dos direitos humanos e à justiça social, manifesta seu repúdio à recente decisão da Justiça Federal que absolveu a Samarco, Vale, BHP Billiton, VogBR e sete de seus executivos e técnicos pela tragédia de Mariana. O rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 5 de novembro de 2015, devastou comunidades inteiras, destruiu o meio ambiente e ceifou a vida de 19 pessoas, tornando-se o maior desastre ambiental da história do Brasil. Esta decisão, nove anos após o ocorrido, representa um retrocesso para os direitos das vítimas e para a justiça ambiental em nosso país.
É inaceitável que, diante das evidências e da devastação causada, as empresas e os responsáveis sejam absolvidos com a justificativa de “ausência de provas suficientes” para configurar crime. A devastação e os impactos imensuráveis que até hoje assolam Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e diversas comunidades ao longo do Rio Doce clamam por uma responsabilização efetiva. Esta decisão sinaliza que a vida e a dignidade das comunidades atingidas, muitas ainda sem amparo e sem respostas, foram relegadas a segundo plano.
A ComCausa solidariza-se com as vítimas e os moradores atingidos, que lutam diariamente para reconstituir suas vidas e preservar seus direitos básicos. Reforçamos nosso compromisso de apoiar e ecoar a voz dessas comunidades em busca de justiça. É inadmissível que crimes ambientais dessa magnitude fiquem impunes, permitindo que empresas e seus gestores escapem das consequências de sua negligência.
Reiteramos a necessidade urgente de rever essa decisão e exigimos que os responsáveis sejam devidamente responsabilizados. Acreditamos que somente com uma justiça firme e comprometida com os direitos humanos será possível construir um Brasil mais justo, onde a vida e a dignidade das pessoas estejam acima de interesses corporativos.
ComCausa – Direitos Humanos e Justiça Social
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