Manoel dos Reis Machado, mais conhecido como Mestre Bimba, emerge como uma figura central na história da capoeira, introduzindo uma revolução na forma como essa arte marcial afro-brasileira era praticada. Na virada da década de 1920, Bimba, oriundo do Engenho Velho de Brotas, em Salvador, se destacou como pioneiro ao criar a capoeira regional, também conhecida como luta regional baiana.
Influenciado por sua profunda compreensão da capoeira primitiva, a capoeira Angola, e das técnicas de luta do batuque, Mestre Bimba tornou-se o primeiro mestre de capoeira a desenvolver um sistema de ensino estruturado. Além disso, foi o precursor ao ministrar suas aulas em espaços fechados, rompendo com a tradição de praticar exclusivamente ao ar livre.
Em uma época marcada pela intensa perseguição às expressões da cultura negra, Mestre Bimba não apenas conquistou respeito, mas também desafiou estereótipos e preconceitos. Muniz Sodré, ex-aluno e autor do livro “Mestre Bimba: corpo de mandinga”, descreve Bimba como uma das últimas figuras do ciclo heróico dos negros na Bahia, destacando sua imponência física, consciência e erudição sobre a cultura negra.
Nascido em 23 de novembro de 1899, Bimba iniciou sua jornada na capoeira aos 12 anos, aprendendo o batuque sob a orientação do africano Bentinho, capitão da Companhia de Navegação Baiana. Aos 18 anos, ele começou a lecionar, tornando-se Mestre Bimba aos 27 anos.
O ponto de virada na história da capoeira ocorreu em 1928, quando Bimba criou a Capoeira Regional, uma fusão do batuque com a capoeira Angola, enriquecendo-a com mais golpes e transformando-a em uma verdadeira luta, benéfica tanto para o físico quanto para a mente.
Ao longo dos anos, Mestre Bimba desenvolveu uma metodologia própria de ensino, introduzindo rituais como o batizado, a formatura e a especialização. Ele elevou a capoeira a uma prática dual: uma forma de defesa pessoal e uma manifestação cultural e artística.
Antes da intervenção de Bimba, a capoeira era considerada ilegal e associada a estigmatizações de “coisa de malandro” e de escravos “fujões”. Em 1932, fundou sua primeira academia, a primeira a receber um alvará oficial em 1937, marcando o início do reconhecimento legal da capoeira.
Em 1953, durante uma apresentação para o presidente Getúlio Vargas, Mestre Bimba recebeu um elogio significativo: “A capoeira é o único esporte verdadeiramente nacional.” Contudo, somente em 1972, a capoeira foi oficialmente reconhecida como prática esportiva pelo Conselho Nacional de Desportos.
Mestre Bimba faleceu em 1974, aos 73 anos, vítima de um derrame cerebral. Sua contribuição para a difusão da cultura afro-brasileira vai além da capoeira, abrangendo manifestações como o samba de roda e o maculelê. Seu legado perdura na profissionalização, metodologia e no respeito conquistado pela capoeira, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. Em 1996, Mestre Bimba recebeu homenagens póstumas, incluindo o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Federal da Bahia e a Medalha Thomé de Souza da Câmara Municipal de Salvador.