Em uma operação batizada de “Lume”, na manhã desta terça, dia 12 de março de 2019, foram presos o sargento da PM reformado Ronnie Lessa, de 48 anos, e o ex-PM Elcio Vieira de Queiroz, de 46. A ação foi realizada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO/MPRJ) do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), e pela Polícia Civil.
Ronnie e Élcio foram presos quando estavam saindo de suas casas e não resistiram à prisão. O Ministério Público já acatou a denuncia contra os dois, ou seja, já são réus e já começou a instrução criminal.
Segundo as investigações da GAECO/MPRJ, o assassinato foi planejado durante três meses de forma meticulosa. O sargento da PM Ronnie Lessa é acusado de efetuar os disparos e Elcio Vieira – policial militar expulso da corporação – foi quem teria dirigido o carro Cobalt na noite do crime.
Os agentes também estão executando 34 mandados de busca e apreensão nos endereços dos denunciados e outros locais para obter computadores, telefones, documentos, além de armas e munições.
Os acusados foram levados para Divisão de Homicídios, na Barra da Tijuca. Onde um advogado já aguardava a chegada dos presos.
Foto com Bolsonaro
Usuários do Twitter e Facebook compartilham nas redes sociais uma foto postada por um perfil atribuído ao ex-PM Elcio de Vieira Queiroz, um dos presos pela polícia por ter participado do assassinato da Marielle e Anderson, abraçado o presidente Jair Bolsonaro. Queiroz, teria postado a imagem em que aparece lado a lado com o Bolsonaro no último dia 4 de outubro, às vésperas do primeiro turno da eleição presidencial.
Queiroz, de 46 anos, teria postado a imagem em que aparece lado a lado com o Bolsonaro no último dia 4 de outubro, às vésperas do primeiro turno da eleição presidencial – Reprodução / Facebook.
Autor dos disparos
Ronnie foi preso em casa em um condomínio na Barra da Tijuca, local onde anteriormente também residia o Jair Bolsonaro antes de se tornar presidente e mudar para Brasília.
Segundo a investigação, ele é conhecido por ser exímio atirador e por sua frieza. Os agentes constataram Ronnie Lessa fez várias pesquisas na internet sobre agendas de Marielle, e que desde outubro de 2017, também pesquisava a rotina do deputado Marcelo Freixo.
No dia do atentado, além de máscara, ele terias usado uma espécie de “segunda pele”. Uma malha que cobria os braços para dificultar um possível reconhecimento.
PM reformado perdeu perna em atentado a bomba
Ronnie Lessa perdeu uma das pernas após uma granada explodir dentro de seu carro em Bento Ribeiro, no ano de 2009. O ataque aconteceu a poucos metros do 9º BPM (Rocha Miranda) onde ele era lotado. Lessa também atuou, cedido pela PM, na Delegacia Antissequestro (DAS). O atentado que mutilou o PM estaria associado a uma disputa interna pela segurança do contraventor Rogério de Andrade, que também sofreu um ataque a bomba seis meses antes. Diego de Andrade, filho de Rogério, morreu em uma emboscada contra o pai, ocorrido na Barra da Tijuca.
O autor de ambos os ataques seria o ex-sargento do Exército Volber Roberto da Silva Filho. Volber foi morto numa ação da Polícia Civil, em 2018, durante uma troca de tiros num motel em Jacarepaguá. O tiroteio, segundo o relato dos informantes, teria sido forjado para encobrir o assassinato do ex-sargento.
Em abril de 2018, Ronnie Lessa também foi alvo de uma tentativa de assalto, conforme divulgado na época. Ronnie estava acompanhado de um militar do Corpo de Bombeiros e reagiu a uma abordagem na Barra. O PM reformado acabou atingido de raspão no pescoço e o bombeiro no braço.
Junto com os pedidos de prisão e de busca e apreensão, o Ministério Público pediu a suspensão da remuneração e do porte de arma de fogo de Lessa.
Operação Lume
A Operação Lume foi batizada em referência a uma praça no Castelo, no Centro do Rio, conhecida como Buraco do Lume, onde militantes de partidos de esquerda fazem prestações de contas públicas nas sextas. Marielle desenvolvia um projeto chamado Lume Feminista. Além de significar qualquer tipo de luz ou claridade, a palavra lume compõe a expressão ‘trazer a lume’, que significa trazer ao conhecimento público, vir à luz.
“Além de significar qualquer tipo de luz ou claridade, a palavra lume compõe a expressão ‘trazer a lume’, que significa trazer ao conhecimento público, vir à luz”, informa o comunicado do MP. “É inconteste que Marielle Francisco da Silva foi sumariamente executada em razão da atuação política na defesa das causas que defendia”, diz a denúncia, acrescentando que a ação foi um golpe ao Estado Democrático de Direito.
A repercussão nacional
A esposa de Marielle, Monica Benicio, afirma: Parabéns às promotoras, e a todos os envolvidos. Espero poder ter acesso aos detalhes para que sinta segurança nesse resultado. Mas ainda falta a resposta mais urgente e necessária de todas: QUEM MANDOU MATAR Marielle? Espero não ter que aguardar mais um ano para saber.
Quem foram os mandantes
O deputado federal Marcelo Freixo postou em suas redes sociais: “o assassinato de uma vereadora é um crime político. Por isso é fundamental sabermos qual grupo político é capaz de, em pleno século XXI, mandar elimar uma autoridade pública que tenha cruzado seu caminho. Precisamos descobrir quem são os mandantes da execução de Marielle Franco”.
Ele ainda acrescenta: “As prisões dos executores de Marielle e Anderson são importantes e tardias. É inaceitável que se demore um ano para termos alguma resposta. É um passo decisivo, mas o caso não está resolvido. É fundamental saber quem mandou matar e qual a motivação”.
O assassinato de uma vereadora é um crime político. Por isso é fundamental sabermos qual grupo político é capaz de, em pleno século XXI, mandar elimar uma autoridade pública que tenha cruzado seu caminho. Precisamos descobrir quem são os mandantes da execução de Marielle Franco.
Indenização dos familiares
Além da denuncia contra os Ronnie Lessa e Elcio Vieira de Queiroz. O MP também requeriu indenização por danos morais aos familiares das vítimas e a fixação de pensão em favor do filho menor de Anderson até completar 24 anos de idade.
Marielle foi assassinada no dia 14 de março de 2018 – Carro da vereadora com marcas de tiro e vidros estilhaçados foi levado para a DH, após perícia inicial – Maíra Coelho / Agência O Dia.
“É inconteste que Marielle Francisco da Silva foi sumariamente executada em razão da atuação política na defesa das causas que defendia”, diz a denúncia acrescentando que a barbárie praticada na noite de 14 de março de 2018 foi um golpe ao Estado Democrático de Direito.
Relembre o caso
O crime aconteceu nesta quarta-feira, 14 de março, na rua Joaquim Palhares, no Estácio, e o motorista que estava com ela, identificado como Anderson Pedro Gomes, também foi assassinado a tiros. De acordo com a imprensa carioca, a vereadora estava acompanhada ainda da assessora Fernanda Chaves, que sobreviveu. Segundo o jornal Extra, a Polícia Civil encontrou pelo menos oito cápsulas no local. Os relatos preliminares dão conta de que os criminosos abriram fogo contra o carro. Nenhum objeto foi levado. “Há sinais de execução”, disse, emocionado, o deputado estadual Marcelo Freixo, de quem Marielle Franco foi correligionária no PSOL e assessora, no Jornal da Globo. Segundo o mesmo telejornal, crime de mando ou execução é também a principal hipótese com a qual a polícia trabalha neste momento.
O PSOL também lançou nota, que pede apuração: “Exigimos apuração imediata e rigorosa desse crime hediondo. Não nos calaremos!” Dias antes do assassinato, Marielle Franco havia criticado a ação supostamente violenta dos policiais na comunidade do Acari, no Rio. “Precisamos gritar para que todos saibam o está acontecendo em Acari nesse momento. O 41° Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro está aterrorizando e violentando moradores de Acari. Nessa semana dois jovens foram mortos e jogados em um valão. Hoje a polícia andou pelas ruas ameaçando os moradores. Acontece desde sempre e com a intervenção ficou ainda pior”, escreveu, na citação do jornal O Dia de quatro dias atrás. Em 28 de fevereiro, ela havia se tornado relatora da comissão destinada a acompanhar a controversa intervenção federal. Uma imagem com a frase “não foi assalto” se espalhava rapidamente pelas redes na noite de quarta-feira.
Marielle Franco se formou pela PUC-Rio e fez mestrado em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense (UFF), com foco nas UPPs. Ela coordenou a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), ao lado do deputado Marcelo Freixo. A ativista decidiu pela militância em direitos humanos após ingressar no pré-vestibular comunitário – justo o momento que lembrou nesta quarta no evento com outras mulheres negras – e com a morte de uma amiga a tiros. Ela deixou uma viúva e uma filha de 19 anos.
O assassinato de Marielle e de seu motorista coloca em xeque mais uma vez as políticas para conter a criminalidade no Rio. “Estou devastado (…) Temos estado juntos na longa militância. Estive com ela dois dias antes de viajar, semana passada. Faltam palavras para expressar o horror e mal posso imaginar o que se passa na cabeça de sua filha e de sua família. E o motorista, sua família, um trabalhador inocente, honrado? A polícia confirma que foi execução”, desabafou nas redes sociais o cientista político Luiz Eduardo Soares, especialista em segurança pública. Soares lembrou o caso da juíza Patricia Acioly, assassinada em 2011 por policiais militares, afirmando que “é possível que o mesmo tenha acontecido” com Marielle. “(…) quando a população vai despertar e entender que a insegurança pública começa nos segmentos corruptos e brutais das polícias, e que não podemos conviver mais com esse legado macabro da ditadura. Vamos continuar falando em “desvios de conduta individuais”? O que fazer, agora, além de chorar?”, escreveu Soares.
| Adriano Dias – fundador da ComCausa.