O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou nesta terça-feira (10) uma resolução histórica que obriga os cartórios de todo o Brasil a reconhecerem formalmente as mortes ocorridas durante a ditadura militar (1964-1985) como responsabilidade do Estado brasileiro. A decisão visa corrigir as certidões de óbito das vítimas, indicando que as causas das mortes não foram naturais, como muitas vezes registrado, mas decorrentes de ações do regime.
A resolução exige que as certidões de óbito sejam alteradas para incluir informações que esclareçam que as mortes ocorreram em decorrência de torturas, desaparecimentos forçados, execuções sumárias ou outras formas de repressão patrocinadas pelo Estado. A medida é uma resposta às demandas históricas de familiares de vítimas e movimentos sociais, que há décadas lutam pelo reconhecimento oficial da verdade sobre os crimes da ditadura.
Toda a documentação necessária para essas correções deverá ser fornecida gratuitamente pelos cartórios, garantindo que os familiares das vítimas não enfrentem barreiras financeiras ou burocráticas para obter justiça.
Impacto da decisão
O presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, destacou que a medida representa um marco no processo de reparação histórica. “O Estado brasileiro tem uma dívida moral com as vítimas da ditadura e suas famílias. Reconhecer formalmente as circunstâncias de suas mortes é um passo importante para a verdade e a justiça”, afirmou Barroso durante a sessão.
A resolução também busca contribuir para a preservação da memória e evitar que as violações ocorridas durante a ditadura sejam esquecidas. “Corrigir as certidões de óbito é mais do que um ato administrativo. É um reconhecimento do sofrimento das famílias e uma reafirmação do compromisso do Estado com os direitos humanos”, declarou a conselheira responsável pela proposta, Maria Thereza de Assis Moura.
Procedimentos para correção
Os cartórios serão obrigados a:
- Receber solicitações de familiares ou representantes legais para a correção das certidões de óbito.
- Atualizar as informações de causa mortis, baseando-se em documentos oficiais como relatórios da Comissão Nacional da Verdade (CNV) ou decisões judiciais que comprovem a responsabilidade do Estado.
- Isentar os solicitantes de taxas ou custos administrativos, garantindo que o processo seja acessível a todos.
A documentação necessária incluirá relatórios oficiais, atestados de óbito e outros registros que demonstrem as circunstâncias das mortes.
Histórico e contexto
A ditadura militar brasileira foi marcada por graves violações de direitos humanos, incluindo tortura, desaparecimentos forçados e execuções sumárias. Estima-se que mais de 400 pessoas foram mortas ou desapareceram durante o período, embora o número real possa ser maior devido à ausência de registros detalhados.
O relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), publicado em 2014, foi um marco no reconhecimento desses crimes. Ele identificou 434 mortes e desaparecimentos políticos, além de milhares de casos de tortura. No entanto, muitas das certidões de óbito dessas vítimas ainda indicam causas naturais ou são omissas sobre as circunstâncias reais das mortes.
Reação de familiares e movimentos sociais
Organizações de direitos humanos e familiares das vítimas comemoraram a decisão como um passo importante no processo de reparação. Para Rosa Cardoso, ex-integrante da CNV, “essa resolução do CNJ é uma vitória para as famílias que há décadas buscam por justiça e por um reconhecimento oficial das barbaridades cometidas durante a ditadura”.
A ComCausa, organização da sociedade civil comprometida com a promoção dos direitos humanos, também celebrou a decisão. “Este é um momento histórico que reafirma a necessidade de justiça para as vítimas e suas famílias. Reconhecer formalmente essas mortes é essencial para consolidar nossa memória e garantir que nunca mais permitiremos as violações que marcaram a ditadura militar”, afirmou João Oscar, colaborador da ComCausa.
Próximos passos
A resolução entrará em vigor em 30 dias e será implementada por todos os cartórios do país. O CNJ prevê a criação de um sistema de monitoramento para garantir que as correções sejam realizadas de maneira eficiente e padronizada. Além disso, o órgão planeja promover campanhas de conscientização para informar os familiares das vítimas sobre seus direitos.
Um marco na busca por justiça
A decisão do CNJ reforça o compromisso do Brasil com a memória, a verdade e a justiça, elementos fundamentais para consolidar a democracia e prevenir novas violações de direitos humanos. Ao reconhecer as mortes da ditadura como responsabilidade do Estado, o país dá um passo importante para reparar os erros do passado e garantir que eles jamais se repitam.
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